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5 de Março de 2021

Game Changer 11 – Entrevista com Maria João Condessa

Licenciada em Gestão de Empresas, com pós-graduações em Gestão e Avaliação da Formação e Programa de Alta Direção de Instituições de Saúde, Maria João Condessa, pertenceu também a equipas de gestores dos Fundos Comunitários nos Ministérios da Economia e da Saúde. Em 2011, resolveu mudar de rumo e fundou a MJC Consulting, uma empresa especializada na prestação de serviços de consultoria onde é atualmente CEO e Managing Partner.

Com mais de 25 anos de experiência na gestão, consultoria e acompanhamento de projetos, faz nesta entrevista um balanço da sua carreira profissional até ao momento, fala da maneira como perceciona o mercado onde atua, ao mesmo tempo que explica todos os desafios que enfrenta diariamente na área de atribuição de fundos…

É licenciada em gestão de empresas. O que a levou a escolher esta área?

MJC- Foi algo muito natural, sempre gostei de “organizar coisas”, desde miúda que gostava de pensar em pequenos negócios, o meu pai era empresário e sempre me estimulou com jogos de aritmética, ele foi também para mim uma grande inspiração.

Pertenceu às equipas dos gestores dos Fundos Comunitários nos Ministérios da Economia e da Saúde (PEDIP, POE, PRIME, Saúde XXI, Organismo Intermédio ACSS). Em que momento decidiu fazer a mudança e passar para o “outro lado” ao fundar a MJC Consulting?

MJC- A minha primeira experiência profissional foi como bolseira do INETI com funções de técnica superior na gestão de projetos com recursos ao financiamento público (PEDIP I), o que veio a marcar o meu percurso profissional. Pertenci a estas equipas com um profundo sentido de serviço público e sempre com o entusiasmo de apoiar as empresas ou outras organizações que recorrem aos financiamentos públicos para os seus investimentos. Aprendi muito e foi um privilégio ter tido a oportunidade de contribuir para a definição das prioridades desta política pública e apoiar as estruturas e as organizações nesse sentido. Todo o processo de crescimento pessoal e profissional requer, por vezes, mudanças de contexto e a vontade de apoiar as empresas e outras organizações de forma mais próxima levou-me a concretizar o atual projeto empresarial e que já vai fazer 10 anos.

Existem diversos apoios a que as organizações e empreendedores podem recorrer. Considera que as pessoas estão informadas sobre os mesmos?

MJC- Há muita informação a circular, nas redes sociais, nos mailings de entidades consultoras e contabilistas certificados aos seus potenciais clientes, a realização recente de webinars e a informação do Portugal 2020 nas diferentes plataformas dos organismos dos sistemas (AD&C, COMPETE, AICEP, IAPMEI, PO Regionais, GAL, …). Outra coisa é dizer que as pessoas se sentem informadas e orientadas sobre as oportunidades de financiamento. A complexidade e diversidade de plataformas e de sistemas de incentivos dificulta a clareza da informação que chega aos diversos públicos alvo, principalmente a empresas com menor dimensão e empreendedores.
É difícil compreender quais os financiamentos mais adequados e o seu acesso sem qualquer apoio de quem que esteja por dentro do sistema.

Quais os principais desafios com que se tem deparado na atribuição de fundos?

MJC- Um dos principais desafios, que não facilita a clareza e simplificação da informação, é a falta de uniformização de critérios nos diferentes organismos, que se deve a falhas de organização e gestão dos organismos, sobretudo na sua coordenação e espírito colaborativo. Lamento dizer, em certos aspetos devíamos estar mais ágeis na gestão de todos os processos, com uma maior liderança na avaliação contínua dos serviços, no feedback dos beneficiários que são os clientes do sistema, ainda que os regulamentos em vigor mantenham a sua complexidade, mesmo após algum esforço na sua simplificação.

Estamos a saber aproveitar mais e melhor os apoios ao nosso dispor?

MJC- Há uma crescente utilização dos apoios dos fundos estruturais por parte das empresas, mais empresas a investirem mais, em diferentes setores de atividade e nas diferentes regiões do país. Os indicadores macroeconómicos que avaliam o efeito destes apoios públicos na economia revelam uma relação positiva nesta utilização, nomeadamente pelo aumento das exportações portuguesas fruto da maior visibilidade dos produtos e serviços portugueses que têm beneficiado de campanhas de marketing internacional muito bem feitas e também pela introdução de inovação e/ou tecnologia nos processos e produtos nacionais, que surgem agora com mais valor acrescentado.

Verifica-se também maior eficiência e eficácia na utilização dos fundos estruturais pelos agentes públicos, decorrente da sua experiência por um lado e também pela necessidade de cumprimento das metas da Estratégia Europa 2020, por outro. De referir que foram estabelecidos para 2020 indicadores de resultados semelhantes para todos os Estados- membros da UE, visando aumentar o emprego, a produtividade e a coesão social no espaço de uma década. Saliento dois pensados para o sistema educativo e formação profissional, áreas chave da GALILEU e que Portugal demonstrou uma fortíssima recuperação: a taxa de abandono escolar de educação e formação passou de 28,3% em 2010 para 10,6% em 2019 (meta é 10% em 2020) e a % de diplomados com ensino superior ou equivalente (30-34 anos) que passou de 24% em 2010 para 36,2% em 2019 (meta é 40% em 2020).

Que qualidades e características identifica nas organizações portuguesas que as tornam únicas e com grande potencial de internacionalização?

MJC- Sem dúvida que as nossas empresas são resilientes e flexíveis, têm um potencial de diferenciação pelos excelentes produtos que oferecem, veja-se o caso do setor agroalimentar ou do turismo. Oferecemos autenticidade, os produtos são genuínos, têm por onde se afirmar. Na produção do azeite tem sido notável o aumento da qualidade e diversidade do produto nacional, quer no azeite de Trás-os-Montes, quer na Região Centro ou Alentejo. Assistimos assim ao consequente aumento da sua exportação, ainda que os azeites italianos e espanhóis tenham maior notoriedade nos mercados internacionais, estamos a ganhar quota de mercado internacional. Também no setor do vinho e no enoturismo; temos vinho de enorme qualidade, podendo diferenciar-se em determinados nichos de mercado com um preço superior. Somos líderes no setor da cortiça, na produção tomate e outros exemplos existirão. Foi feito um trabalho de décadas no setor do calçado muito interessante, com forte liderança associativa, introduziu-se design, acrescentou-se valor ao produto competindo com o mercado italiano (o nosso calçado é o segundo mais apreciado do mundo), coisa que se perdeu no têxtil…

Acredito também no crescimento do orgulho no nosso País, em ser português, em comprar português. E, sobretudo, na capacidade de as empresas portuguesas trabalharem com outros mercados de diferentes culturas e com a sua naturalidade de aprendizagem na fonética das diferentes línguas, as habilidades de comunicação, a criatividade, e o nosso sentido do “desenrascanço” muito útil em momentos conturbados como este, sendo competências muito valorizadas no presente e no futuro.

Que projeto de internacionalização foi mais desafiante para si e porquê?

MJC- Sem estar a referir nenhum em especial, os projetos mais gratificantes para um consultor são aqueles em que percebemos que ajudámos a criar um produto, a desenvolver uma marca, a promover essa marca num mercado competitivo e perceber os efeitos do apoio de consultoria e do financiamento público, sem os quais não seria possível, ou tão rápido e eficaz concretizar os objetivos desses processos de internacionalização.

Na sua opinião, o que falta nas organizações portuguesas para serem mais competitivas?

MJC- Trabalharem melhor em conjunto, saberem cooperar, trabalharem melhor em dimensão, terem escala…, serem mais competitivos e ágeis em ambientes globais.

Porque razão nos falta esta afirmação? Porque razão não temos a robustez da organização (à alemã), ou a liderança com um sentido mais estratégico de longo prazo? Ou uma confiança aliada à nossa identidade? Trabalharmos bem-comum, no coletivo é um desafio para o nosso ADN.

Enquanto líder, que competências chave identifica na sua equipa para conseguir dar resposta aos diversos desafios do dia a dia?

MJC- Na MJC temos de ser colaborativos. Um líder tem de ter cada vez mais um papel orientador e estimular a autonomia e criatividade dentro das suas equipas, definir um rumo associado à estratégia que pode ser revista com alguma periodicidade, mas dar flexibilidade de atuação às equipas na resolução de problemas. Sempre tive uma abordagem participativa na forma de coordenar as equipas e o meu interesse é saber fazê-lo cada vez melhor. Ao praticarmos internamente na empresa este espírito colaborativo, as equipas também o desenvolvem de forma mais natural no trabalho com o cliente. Acreditamos que somos um apoio permanente às necessidades dos nossos clientes e quanto mais compreendermos isto mais antecipamos essas mesmas necessidades e consolidam-se as relações internas e externas.

Que projetos, pessoais ou profissionais, tem ainda por realizar?

MJC- Estar aberta a novas áreas, setores. A consultoria de gestão tem um enorme potencial por explorar em domínios empresariais vários, basta manter a curiosidade, estar aberto a aprender, a crescer com os clientes. É um privilégio quando sentimos esta utilidade e prazer em trabalhar.

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